O fabrico clandestino de fogos de artifício é uma marca da zona rural de Santo Antônio de Jesus e de Muniz Ferreira. Porém, ninguém consegue localizar um, a não ser por meio de denúncias. Pode ser nos fundos de uma casa ou em simples roçado, com uma barraca improvisada, onde a produção é toda artesanal. O fabrico é diário e acontece ao longo do ano. O pico da produção é em janeiro e junho.
De julho a setembro há uma queda, que aumenta em novembro e dezembro. “Clandestino é o vendedor da matéria-prima para os pequenos produtores informais, que compram o produto 300% mais caro. É uma atividade potencial que precisa se organizar. Fogueteiro não é marginal e luta para sair da informalidade”, defende José Carlos Toneto, da Associação dos Produtores de Fogos de Santo Antônio de Jesus (Asfogos).
O perigo é total. Em uma das fábricas clandestinas de fogos de artifício visitadas por A TARDE não havia extintor de incêndio ou outro equipamento de segurança. É tudo improvisado. “O que existe é a experiência do produtor. Na hora da queima da prata, que é perigosa, o produtor tem que estar por perto, checando se está sendo respeitado todo o processo; no enrolamento das cobrinhas, a massa tem que estar sempre úmida, senão explode; a pessoa que soca o material não pode ficar de costas para a parede; é proibido fumar. São cuidados para evitar acidentes, mas se houver uma explosão, sai correndo e deixa queimar tudo”, disse um produtor que não quis se identificar.
Nos fabricos, não se costuma estocar os fogos prontos e nem a matéria-prima. “Tudo o que é produzido é vendido rapidamente. Temos muitas encomendas e compradores certos”, relatou o produtor. Numa tenda, trabalham no máximo oito pessoas. A entrada de crianças e adolescentes não é permitida. Mulheres e homens produzem a quantidade que podem para faturar até R$ 600 por mês.
Uma jovem de 29 anos disse que sempre trabalhou com fogos e já até teve carteira assinada quando trabalhou numa fábrica do Condomínio Fênix, para onde disse não querer mais voltar. O Condomínio Fênix (Cofênix) foi criado em 2002 com a tarefa de orientar os produtores em cursos profissionalizantes e treinamentos para segurança na fabricação de fogos e abrigar, inicialmente, quatro fábricas. Uma delas é a Brasilian Fire Works.
“Lá no Cofênix ganhava menos que aqui. Assinavam carteira, mas pagavam R$ 150 por mês. Aqui ganho quatro vezes mais”, falou. Outra diz que prefere trabalhar numa tenda. “Não quero ser humilhada e ser tratada como escrava. Nasci dentro da pólvora e criei seis filhos com fogos”, disse.
Obstáculos- A entrada clandestina da matéria-prima no Estado e a falta de denúncias são os principais obstáculos à atuação dos órgãos fiscalizadores no combate à produção clandestina de fogos de artifício nos municípios do Recôncavo baiano. Segundo a Polícia Civil, a fiscalização só pode ser feita após denúncias da população. Por sua vez, o Exército anuncia que só pode fiscalizar as fábricas legalizadas.
Após a explosão da fábrica clandestina que matou 64 trabalhadores em 1998, Santo Antônio de Jesus passou a ficar na mira dos órgãos que querem inibir o manejo imprudente dos fogos. A fiscalização se intensificou e, assim, a produção informal migrou para o município vizinho, Muniz Ferreira (a 30 km de Santo Antônio), considerado um celeiro de fogos, já que os cerca de seis mil habitantes vivem praticamente disso. São centenas de tendas de fogos espalhadas pelos distritos. A produção ilegal corre solta na maioria dos 12 distritos da zona rural. Os fabricos ficam escondidos em casas abandonadas ou no meio do mato, tornando o acesso difícil para a polícia.