Refeição popular é a única do dia para 22% dos freqüentadores desses locais
PATRICK BROCK
Os três restaurantes populares de Salvador atendem cerca de 4.600 pessoas por dia, empregando uma estrutura industrial para servir comida básica por até R$ 1. A TARDE visitou ontem as unidades e constatou que a população está satisfeita com o serviço, embora a comida trivial seja um contraste numa cidade com culinária marcante. O preço é o grande motivador dos freqüentadores, dos quais 22% declaram que a refeição popular é a única consumida no dia.
Nos dois restaurantes administrados pelo governo do Estado (Prato do Povo, na Liberdade e no Comércio), o sistema de cozinha industrial fornece comida simples: arroz, feijão, bife de frango, banana (sobremesa) e suco de maracujá era o cardápio de ontem. Dos itens listados, o suco mostrou-se o menos palatável: estava ralo. No Prato Popular (São Tomé de Paripe), parceria da iniciativa privada com a prefeitura, a comida no primeiro dia de funcionamento, semana passada, era bem simples: carne moída e abóbora, arroz, feijão e salada de cenoura, com água à vontade e farinha. Famílias inteiras tentavam o cadastramento para desfrutar da refeição a R$ 0,50.
De acordo com a nutricionista Lidimary Alves, supervisora-geral dos restaurantes Prato do Povo em Salvador, a refeição fornecida tem de 1.400 a 1.600 kcal, padrão recomendado pelo Programa de Alimentação do Trabalhador, do governo federal. Na Liberdade, a unidade conta com 53 funcionários terceirizados e instalações que seguem o padrão exigido pela Vigilância Sanitária, que inclui salas de preparo climatizadas. Lidimary revela que a maioria dos restaurantes de Salvador não segue os padrões.
PERFIL A pesquisa do Ibope para o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) foi divulgada em setembro de 2005 e traçou o perfil dos clientes dos restaurantes populares: a maioria (54%) tem escolaridade até a 8ª série e é homem (70%); 84% vão almoçar a pé ou de ônibus; e 45% dos entrevistados disseram que sempre vão aos restaurantes do governo. Um quinto (21%) não tem residência fixa e 31% ganham até um salário mínimo. Os dados mostram que os restaurantes beneficiam o estrato social mais pobre da sociedade, mas são procurados também por universitários (47%).
Enquanto Lidimary explica o funcionamento do restaurante, um homem cria confusão na entrada. Com uma linguagem desconexa, ele reclama do tratamento, dizendo que já pagou a refeição. Lidimary conta que ele é um cliente costumeiro, com variações abruptas de humor.
O choque social é um dos grandes aspectos do restaurante. Ele é percebido, por exemplo, naqueles que entram na fila e passam a pedir esmolas até conseguir o suficiente para a refeição; ou na mãe que traz os três filhos desnutridos para almoçar; no jovem de obesidade mórbida que toma dois litros de refrigerante durante as refeições; na mulher que entra arrastando-se no restaurante e, depois de comer, sai andando; e na senhora que vem ao restaurante com suas roupas estilo malhação toda uma diversidade de tipos que giram em torno de uma das necessidades primordiais do ser humano.
Lidimary admite que a refeição é simples, mas afirma: Nem sempre o que comemos em um restaurante de luxo é saudável. As duas mil refeições diárias do Prato do Povo, na Liberdade, são saudáveis e satisfatórias para o gosto da comunidade, afirma a nutricionista.
São pessoas como o vendedor autônomo Antônio Pessoa, 37 anos, que mora no bairro Fazenda Grande mas almoça no Prato do Povo da Liberdade quase todos os dias. Acho que em cada bairro deveria ter um restaurante como este. Outro que come diariamente no Prato do Povo da Liberdade é o entregador Vanderlei Souza Silva, 25 anos: Às vezes cai um pouco, mas o preço é bom, nem um lanche custa mais R$ 1, diz.