Silêncio é a palavra de ordem para os moradores do KM-17, uma região do bairro de Itapuã, orla norte de Salvador, onde dois grupos rivais disputam o controle do tráfico de drogas e impõem aos moradores o toque de recolher a partir das 22 horas. O aviso é claro: qualquer informação passada à polícia pode significar a morte do denunciante.
Os moradores mais antigos do bairro, alguns residindo no local há mais de 18 anos, e outros que se dizem representantes comunitários, confirmam a situação, mas, por medo de represálias, evitam ser fotografados ou identificados. Nas ruas Edmundo Spínola, Lafayete Coutinho, Nova Itapuã e José Araújo, Grupos armados trocam tiros com freqüência entre si e ameaçam os moradores que reclamam.
Na 12ª CP, os agentes do Serviço de Investigação (SI) argumentam que têm dificuldades de agir por causa do silêncio dos próprios moradores. “Nós já colocamos à disposição da população os telefones do Disque Denúncia (3235-0000) e da própria delegacia (3116-1530), onde as pessoas podem denunciar sem se identificar, mas isso não acontece”, disse um dos agentes.
Na Rua José Araújo, que é uma espécie de limite do bairro com a invasão Alto do Macaco, e também alvo de disputa de grupos rivais pelo controle do tráfico de drogas, várias casas foram abandonadas nos últimos anos. Quando questionados pela reportagem, os moradores evitam falar sobre o assunto, mas admitem que quem denunciou teve a casa destruída e foi obrigado a abandonar o bairro.
Tiroteios – No último final de semana, houve um tiroteio no início da rua Edmundo Spínola com um grupo liderado por Misso, como é conhecido um homem que seria o líder do tráfico no bairro, e outro grupo rival da rua do Canal do Rio Xangô.
“Foram mais de dez pessoas de cada lado, trocando tiros e todo mundo fechou as portas. Chamamos a Polícia Militar, que veio logo, mas depois todos receberam o aviso de que quem denunciou à polícia seria ‘passado a aço’”, disse uma senhora, de 46 anos, usando a gíria que significa que a pessoa seria assassinada.
Na Polícia, não há registro da ocorrência, mas na 12ª Delegacia, os agentes do SI disseram que tiroteios desse tipo têm sido comuns no bairro. “O problema é que são pessoas que foram criadas ali, que hoje estão no tráfico e brigando entre si. Os moradores têm medo de denunciá-los”, disse um dos agentes.
Infra-estrutura – O representante comunitário Deocranio Araújo prefere não comentar a questão da violência e diz que um dos principais problemas no bairro é a falta de infra-estrutura urbana e social. Há pouco mais de dois anos, por exemplo, o local onde hoje funciona a Associação dos Moradores era ocupado por um módulo da Polícia Militar, que foi desativado. Em decorrência disso, a única proteção fica em um posto policial localizado no Alto do Coqueirinho. Outro problema é a não-conclusão das obras de dragagem do canal por onde passa o Rio Xangô, que se arrasta há mais de quatro anos. “Quando chove, as casas são invadidas pelo rio, que por sua vez trazem esgotos e doenças. E nem temos posto de saúde”, reclama.