Usuários prejudicados podem recorrer à Justiça para reivindicar indenização por dano material ou moral
Berna Farias
A Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) já foi uma das instituições mais confiáveis do País. Hoje, as queixas se acumulam, apontando falhas na prestação de serviços, que vão do atraso na entrega de uma carta simples ao não repasse de valores pagos em compras por reembolso postal.
O que muita gente não sabe é que, embora seja uma empresa pública, os Correios estão sujeitos às mesmas leis do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor, cabendo indenização por dano material ou moral aos consumidores prejudicados.
Um deles é o funcionário da Petrobras José da Guia Souza. No dia 29 de dezembro, ele pagou R$ 166 como taxa de postagem de uma caixa amplificada para guitarra, remetida para um comprador de Minas Gerais.
O comprador retirou a caixa no dia 3 de janeiro e pagou, em uma agência dos Correios daquele Estado, R$ 1.551, valor que seria repassado a José Souza em forma de vale-postal no prazo máximo de seis dias. No dia 11, ele registrou a primeira reclamação, mas, duas semanas depois, não havia conseguido receber o dinheiro.
Estou me sentindo ultrajado, lesado. Os funcionários acham que o vale-postal foi extraviado, mas não têm certeza e ninguém quer assumir nada. Vendi um produto por um valor considerável, para comprar outro, e agora estou tendo prejuízo, inclusive com gastos adicionais de telefonemas para Minas. E tenho que fazer isso porque tudo o que eu consegui de informação, até agora, foi porque eu levantei por conta própria, diz Souza.
Para ele, o que piora tudo é o desrespeito, por meio de um jogo de empurra sem fim, e a prova de ineficiência dos funcionários, que nunca dão informação exata ou coerente. Eles não sabem como a coisa funciona, cada hora me dão um prazo diferente para o vale-postal.
Como o vale, aparentemente, está extraviado, bastaria que os Correios gerassem uma permissão de pagamento, e depois eles que investigassem e localizassem o vale, mas não querem fazer isso. E avisaram que eu não terei nenhum acréscimo, receberei apenas o valor declarado.
MATERIAL SUMIU Outra prejudicada, uma profissional liberal que prefere não se identificar, firmou contrato com os Correios para a entrega de 350 exemplares de uma publicação, pela qual pagou R$ 345,93. O material foi postado dia 29 de dezembro, mas a maioria dos exemplares, encaminhados para empresas de Camaçari e Simões Filho, não chegou ao destino.
Ela passou pelo desgaste e a despesa de contratar motoboys para efetuar a entrega que já estava paga aos Correios.
Após muitos contatos, queixas e reclamações, inclusive encaminhadas à gerente do seu contrato, a única explicação dada por funcionários é a existência de dificuldade na entrega para a Região Metropolitana de Salvador (RMS), e não há perspectiva de entrega nem devolução do material postado.
Pela tabela constante no site dos Correios, o prazo de entrega para correspondência comercial, não comercial e social, local ou de capital para cidades de regiões metropolitanas é de um dia útil após a postagem.
No caso da Bahia, o problema não se restringe a Salvador e RMS. Em cidades de médio porte, como Vitória da Conquista e Itapetinga, em muitos bairros os Correios não chegam: os moradores têm que ir à sede da empresa vasculhar, entre pilhas de correspondências, as que lhes pertencem.
Freqüentemente, dizem os queixosos, contas têm que ser pagas com multas, devido ao não recebimento dos boletos antes do vencimento.
ECT se equipara à empresa privada
Os Correios se caracterizam como empresa pública, e se equiparam a qualquer outra empresa que esteja no mercado de consumo. Se deixa de prestar serviços com adequação, eficiência e sem atender àquilo a que se obrigou, a ECT está sujeita a sofrer ação indenizatória, por parte do consumidor, para ressarcir os prejuízos de ordem material, ou patrimonial, e eventuais danos morais, explica Archimedes Pedreira Franco, superintendente do Procon-Bahia.
O advogado Cândido Sá, que também atua na área de direito do consumidor, concorda: É um prestador de serviços como qualquer outro, sujeito às leis do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor. O contrato de prestação de serviço tem que ser cumprido da forma como ele (os Correios) se obrigou: se o Sedex 10, por exemplo, se propõe a entregar correspondência ou objeto até as 10 horas do dia seguinte à postagem, tem que entregar, argumenta.
A ECT está sujeita, segundo Archimedes, ao que determina o CDC Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 22 e parágrafo único. O artigo diz que Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros. Nos casos de descumprimento, total ou parcial das obrigações, serão compelidos a cumpri-las e a reparar os danos causados, determina o parágrafo.
O dano pode ser somente de ordem moral, esclarece o superintendente. Uma carta desfazendo um noivado que só chega às mãos da pessoa no dia do casamento, ou o convite para missa de falecimento que chega após a realização da mesma justificam um dano moral, porque o atraso na entrega provocou dor, constrangimento. Mas o dano não se justifica por qualquer coisa, é necessário que o consumidor tenha sido, de fato, prejudicado.
FRANQUEADAS Muita gente ainda desconhece que grande parte das agências de Correios é, na verdade, de lojas franqueadas, ou seja, tem contrato para prestar os serviços dos Correios, seguindo regras determinadas pela empresa.
Nos casos em que a correspondência ou objeto foram postados em agência franqueada, o ônus por danos cabe aos Correios, pela chamada responsabilidade solidária quando duas ou mais pessoas respondem juntas por uma situação.
A pessoa entrega sua correspondência na convicção de que está entregando aos Correios. A agência franqueada usa a mesma logomarca e tem procedimentos iguais aos da ECT, o que se enquadra na teoria das aparências.
Sendo prejudicado, o cidadão pode acionar os Correios como os Correios são uma empreas pública, de natureza federal, a queixa deve, de preferência, ser feita na Justiça Federal, que tem um Juizado de Pequenas Causas, diz Archimedes.
Ele critica, ainda, o gigantismo que a Empresa de Correios e Telégrafos ganhou, quando passou a prestar todo tipo de serviço. Nos Corrreios, você se inscreve para concurso, compra telesena, paga boleto bancário. Os problemas, então, se criam por desvio de finalidade: quem vai postar uma carta pega filas imensas.
Portaria regulamenta entregas
Em nota assinada pelo diretor Regional na Bahia, Cláudio Moras Garcia, a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) informa que está à disposição do consumidor uma série de instrumentos com os quais ele pode contar quando se sentir prejudicado: central de atendimento 24 horas, ouvidoria da empresa em Brasília e, pela internet, o sistema de rastreamento de encomendas e o Fale com os Correios.
Ele destaca as determinações da Portaria nº 311 do Ministério das Comunicações, que regulamenta a entrega de objetos postais pelos Correios. O artigo 4º da portaria diz que a distribuição em domicílio será garantida quando atendidas as seguintes condições:
I - os logradouros estejam oficializados junto à prefeitura e possuam placas identificadoras; II - os imóveis possuam numeração idêntica oficializada pela prefeitura e caixa receptora de correspondência localizada na entrada; III - a numeração dos imóveis obedeça a critérios de ordenamento crescente, sendo um lado do logradouro par e outro ímpar; e IV - os locais a serem atendidos ofereçam condições de acesso e de segurança de modo a garantir a integridade física do carteiro e dos objetos postais a serem distribuídos.
EFICIÊNCIA Observando que nenhuma empresa está livre de cometer erros, ele diz que o índice de eficiência das operações dos Correios é de 98% e que, na Bahia, a média de entrega diária é de 1 milhão de objetos, a maioria dentro do prazo. E cita que a pesquisa do Instituto Vox Populi realizada em outubro e novembro de 2005 aponta que 90,2% da população brasileira acredita na empresa.
Sobre a ausência de entrega em bairros de Vitória da Conquista, o diretor diz que os problemas decorrem da ampliação dos locais de distribuição na cidade. No caso de José da Guia Souza, a Diretoria Regional de Minas Gerais, onde foi emitido o vale-postal, informou que houve extravio porque foi colocada como unidade pagadora a Agência Pituba, com o endereço da Agência Franqueada Boca do Rio.
O caso já foi cadastrado e a Gerência de Contabilidade e Controle Financeiro aguarda que a reclamação do Fale com os Correios seja devolvida para emitir a permissão de pagamento ao cliente. Com relação à profissional liberal, por se tratar de caso muito específico, a empresa entrará em contato direto com a cliente.
Recomendações dos Correios
Certificar-se do endereço e CEP para onde o objeto será encaminhado. No site dos Correios, pode ser feita a consulta de CEP (www.correios.com.br)
Checar, na postagem do objeto, quais as garantias que o serviço escolhido para a entrega possui
Postar os objetos com AR Aviso de Recebimento
Registrar imediatamente a reclamação ou crítica nos meios que a empresa disponibiliza
Dicas do Procon
Ao contratar o serviço postal, exigir documento impresso especificando detalhes do contrato e obrigações do fornecedor
Em caso de não cumprimento do serviço, entrar em contato com a empresa. Os Correios devem ressarcir o cliente no valor do transporte e no valor do bem
Não obtendo sucesso, registrar a reclamação no Procon ou na Justiça Federal, que atende a reclamações referentes aos órgãos da União
Inteirar-se do acondicionamento do objeto frágil durante o transporte, para acionar os Correios em caso de avaria
O consumidor não tem obrigação de especificar o valor do objeto transportado para exigir ressarcimento
Serviço
Onde prestar queixa: Núcleo de Atendimento Judiciário (NAJ) da Justiça Federal, no Shopping Baixa dos Sapateiros, tel. 71 3322-9887
Correios: Central 24 horas: 0800 570 0100; Ouvidoria: 61 3327-5455; Fale com os Correios: http://www.correios.com.br/servicos/falecomoscorreios/default.cfm.