Finalizando um ano de homenagens a seu antecessor, o papa Bento 16 viaja para a Polônia nesta semana a fim de pedir aos compatriotas de João Paulo 2o. que defendam a herança cultural do país ao se integrarem a uma Europa cada vez mais secularizada.
O pontífice de 79 anos de idade, nascido na Alemanha, ficará quatro dias na Polônia, a partir de quinta-feira, onde deve visitar todos os locais importantes para a formação espiritual de João Paulo 2o., que morreu em 2 de abril de 2005, após ficar 26 anos no cargo.
A maior parte da viagem acontecerá no sul da Polônia -- onde Bento 16 deve passar por Wadowice, local de nascimento do papa anterior, por Cracóvia, onde o antecessor dele trabalhou como padre, bispo e cardeal, e por vários santuários religiosos caros a João Paulo 2o. e a muitos poloneses.
O atual líder da Igreja Católica também passará pelo campo de concentração nazista de Auschwitz a fim de dar prosseguimento aos esforços do papa anterior para melhorar as relações com os judeus e lutar contra o anti-semitismo.
Uma parada rápida no famoso campo de concentração localizado perto de Cracóvia terá um profundo significado pessoal para o pontífice, que participou da Juventude Hitlerista durante a guerra, quando a inscrição nesse grupo paramilitar era obrigatória.
Mas assessores e comentaristas afirmam que a viagem, cujo mote é "Perseverar na Fé", não se resumirá às celebrações relacionadas com uma das figuras públicas de maior destaque do século 20.
Bento 16 promete apontar um caminho para o futuro espiritual de um país que viu muitas mudanças desde a queda do comunismo, em 1989 -- nem todas boas aos olhos da Igreja.
"Na Polônia, vemos um processo lento mas contínuo de secularização, uma perda do sentimento da fé, de verdade da fé, e do sentimento de se estar perto de Deus", disse o monsenhor Pawel Ptasznik, uma autoridade do Vaticano próxima de João Paulo 2o.
"À medida que a Polônia se transforma em parte da Europa, a mensagem do papa Bento 16 sobre a preservação da fé -- algo que fizemos durante o regime comunista -- é a parte mais importante dessa viagem", disse à Reuters Ptasznik, que chefia o setor polonês do Secretariado de Estado do Vaticano.
CRIANÇA-MODELO - A Polônia conseguiu recuperar-se de uma profunda depressão econômica instalada após o fim do comunismo controlando uma inflação galopante, cortando a maior parte dos subsídios estatais e reestruturando sua indústria por meio de privatizações, investimentos e dispensas.
As reformas fizeram do país uma criança-modelo para as reformas pró-mercado dos anos 90, mas foram implementadas ao custo de uma taxa de desemprego de 20 por cento e da exclusão social de parte da classe trabalhadora de meia-idade e de idade mais avançada.
A explosão de liberdade no período pós-comunista, violenta como foi, e as imperfeições do capitalismo deixaram vários órfãos espirituais no país, acreditam algumas autoridades da Igreja.
"Um mundo economicamente rico costuma perder seus valores fundamentais. Um mundo secular corre o risco, frequentemente, de perder sua identidade cultural e espiritual", afirmou Ptasznik. "O papa deseja dizer: "Não percam a herança conquistada ao longo de anos de sacrifício.""
A Igreja polonesa é menos influente hoje que no passado, mas o país, agora membro da União Européia (UE) e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), continua a ser fervorosamente cristão. Para alguns analistas, a Polônia pode representar a "luz" para uma Europa que a Igreja acredita estar cada vez menos religiosa.
"Acho que Bento 16 falará da morte da Europa devido à descrença e conclamará a Polônia a ser uma líder na luta para ajudar a Europa a religar-se a suas raízes cristãs", disse George Weigel, um importante escritor católico e biógrafo do papa.
Alguns comentaristas acreditam que a viagem para a Polônia pode significar um divisor de águas para Bento 16, marcando o final do processo de transição iniciado com a morte de João Paulo 2.
Mas a maior parte deles diz que o legado do antecessor será sempre parte permanente de seu papado.