O presidente do Egito, Mohamed Mursi, convidou a oposição para um diálogo no próximo sábado, 8, e garantiu que respeita a liberdade de expressão, em um discurso realizado nesta quinta-feira, 6, em rede nacional de televisão, após os violentos confrontos da véspera no Cairo.
"Apelo a todos os partidos políticos para que integrem um diálogo no sábado, dia 8 de dezembro, no Palácio Presidencial", disse Mursi, destacando que as discussões devem ser centradas na elaboração de uma lei eleitoral e de um roteiro a se seguir após o referendo sobre o projeto de Constituição.
Mursi reafirmou que o referendo sobre o projeto de Constituição, que divide o país, será realizado como o previsto no dia 15 de dezembro, apesar da recusa da oposição, e que após a votação o povo "deverá exercer sua vontade".
"Respeitamos a liberdade de expressão pacífica, mas não permitiremos jamais que pessoas participem de assassinatos e atos de sabotagem", declarou o presidente, em meio à crise política que sacode o país.
A oposição denuncia as medidas ditatoriais de Mursi, especialmente o decreto de 22 novembro que impede qualquer ação judicial contra as decisões da presidência, mas também protesta contra o projeto da nova Constituição.
Na noite desta quinta-feira, Mursi se disse disposto a renunciar ao artigo 6 do decreto, que lhe permite "tomar todas as medidas necessárias para proteger o país e os objetivos da revolução", mas não disse nada sobre o bloqueio das ações judiciais contra a presidência.
Manifestantes egípcios colocaram fogo na sede da Irmandade Muçulmana no Cairo na noite desta quinta, disse à AFP Mahmud Ghozlan, porta-voz do movimento islamita ligado a Mursi.
"Duzentos criminosos atacaram a sede. A segurança tentou impedi-los, mas alguns conseguiram entrar por trás, saqueando e colocando fogo no local. Ele ainda está em chamas", declarou Ghozlan.
O Exército egípcio ordenou aos manifestantes que se retirem dos arredores do palácio presidencial, após confrontos entre partidários e opositores do presidente Mohamed Mursi, provocados pela decisão do chefe de Estado de ampliar seus poderes.
O anúncio foi feito após uma reunião do ministro da Defesa e outros funcionários do governo com Mursi, que pretende discursar à nação ainda nesta quinta-feira.
A Guarda Republicana, uma unidade militar encarregada de proteger o presidente, "enfatizou a necessidade de evacuar a área ao redor do palácio até as 15h00 (11h00 no horário de Brasília) e decidiu proibir manifestações no em torno do" complexo no Cairo , de acordo com um comunicado emitido pela presidência.
Apenas os manifestantes pró-Mursi permaneceram perto do palácio após os confrontos que duraram toda a noite, e durante os quais cinco manifestantes foram mortos e centenas ficaram feridos, na pior onda de violência desde a eleição em junho do primeiro presidente islâmico do Egito.
Eles começaram a recolher seus pertences para deixar o local após o ultimato do Exército. Muitos islamitas dormiram no local, em tendas ou enrolados em cobertores, de acordo com um jornalista da AFP.
Durante a noite, confrontos com pedaços paus, coquetéis molotov e pedradas aconteceram entre os lados rivais com breves períodos de calma, e tiros foram ouvidos.
Nas primeiras horas desta manhã, tanques do Exército foram posicionados nas proximidades do complexo presidencial e em uma grande avenida próxima, no bairro residencial de Heliópolis.
O general Mohammed Zaki, chefe da Guarda Republicana, ressaltou que o Exército não irá recorrer à força contra os manifestantes.
As proximidades do palácio refletiam a intensidade dos confrontos: ruas cobertas de pedras e cacos de vidro, com muitos carros com janelas quebradas.
Depois das convocações para manifestações na quarta-feira, a situação degenerou entre os dois campos rivais. Quatro manifestantes foram mortos a tiros e um com um disparo de escopeta no peito, segundo a agência oficial Mena. As autoridades relataram 644 feridos e 50 detenções.
Os opositores de Mursi também incendiaram sedes da Irmandade Muçulmana em Ismailiya e Suez (nordeste).
A Bolsa de Valores do Cairo também sentiu o golpe, o benchmark EGX-30 perdia 4,7% ao meio-dia.
O Egito enfrenta uma grave crise desde a adoção de um decreto em 22 de novembro, segundo o qual, Mursi ampliou seus poderes, uma situação semelhante à de plenos poderes.
A oposição denuncia a guinada autoritária do presidente e pede a anulação do decreto que amplia consideravelmente seus poderes.
Também protesta contra um projeto de Constituição, que será submetido a referendo em 15 de dezembro, porque consideram que abre caminho para uma aplicação ainda mais rígida da lei islâmica e não dá garantias suficientes para proteger os direitos fundamentais, entre eles a liberdade de expressão.
O presidente egípcio assegura que estas medidas são destinadas a acelerar a transição democrática, e insiste que seus poderes excepcionais, que devem terminar com a aprovação da Constituição, são apenas "temporários".
Para sair da crise, a instituição egípcia Al-Azhar, a maior autoridade sunita, pediu a suspensão do decreto.
"Mohamed Mursi. Você é o responsável", acusou a página no Facebook "Somos todos Khaled Said", que contribuiu com a revolta que derrubou Hosni Mubarak em fevereiro de 2011.
"Estamos aqui pela liberdade, eles estão aqui pela violência", afirmou um anti-Mursi, Ali Gamal. "É uma guerra civil que vai queimar a todos", lamentou Ahmed Fahmy.
A oposição exige a anulação do referendo e a suspensão do decreto como condição par ao diálogo.
Mohamed ElBaradei, chefe da coalizão de oposição, culpou Mursi pela violência. "O regime perde a sua legitimidade a cada dia".