Hamilton Assis, candidato ao Senado pelo PSOL
Homologado como candidato do PSOL ao Senado no último dia 14, Hamilton Assis aposta na sua trajetória como ex-candidato a presidente da República e a prefeito de Salvador para enfrentar seus adversários. Representante do segmento afrodescendente na corrida eleitoral de 2014, Assis promete levantar a questão durante os debates.
O que falta ser discutido durante o processo eleitoral e dentro do Senado que o PSOL acredita que deve vir à tona nesse período?
Um debate sobre a dívida pública. Nós consideramos que, em grande parte, os nossos problemas ocorrem em função dessa política econômica que o governo tem desenvolvido, que favorece exclusivamente o setor financeiro. Então, por exemplo, hoje a nossa dívida pública consome cerca de quase 42% anual do nosso Orçamento, enquanto que você gasta para as questões relacionadas à saúde, educação, habitação e segurança pouco mais de 10% do orçamento anual. E a despesa com o pagamento de juros e dividendo da dívida é maior do que a despesa com a Previdência Social. Isso é um absurdo. Há um problema no debate que se faz sobre a questão do Bolsa Família, que é um exagero, que é um paternalismo, e o pagamento da dívida consome mais de 40% do Orçamento e vira uma "bolsa banqueiro", que acaba engordando o cassino da incorporação financeira. Mesmo num país em crise, com muita dificuldade, quem mais lucrou foram os bancos. Vamos fazer esse debate, de como fazer essa redistribuição, porque parte dessa dívida poderia ser investido em infraestrutura e para ajudar a pagar a dívida social desse país.
Esse vai ser o grande tema do PSOL na corrida para o Senado?
É um dos temas que a gente pretende problematizar. Embora, é óbvio, que quando eu digo que estou discutindo essa questão da dívida pública, eu estou discutindo também a questão da prioridade dos investimentos. Eu vou querer discutir educação, saúde, porque eu não posso propor melhorias na saúde e na educação se eu não digo de onde vem o dinheiro. E o dinheiro está sendo escoado por esse ralo da especulação financeira.
O senhor vai enfrentar alguns nomes bem conhecidos do cenário político baiano - o ex-governador Otto Alencar, o ex-ministro Geddel Vieira Lima, e a ex-ministra do Superior Tribunal de Justiça, Eliana Calmon. Como lidar com a condição de ser pouco conhecido?
Nós sabemos que esse é um problema concreto, mas nós temos uma trajetória que não pode ser desprezada. Fui candidato a vice-presidente da República na chapa de Plínio Arruda Sampaio, em 2010, e candidato a prefeito de Salvador em 2012. Acho que tem toda uma trajetória que nós estamos construindo e nos credencia para estar nesse debate e não nos intimidarmos frente a esses nomes apresentados pelos outros partidos. Historicamente o Senado é um espaço reservado às elites e aos políticos quase em fim de carreira ou a prêmios para composições de chapas, inclusive masculinizado. Nós queremos fazer esse debate. A nossa candidatura tem uma origem nas classes populares, isso é fundamental, e de um segmento importante, que são os afrodescendentes.
Em 2012, todas as chapas tinham representantes afrodescendentes. Dessa vez, somente o senhor. Isso aumenta a responsabilidade?
Sem dúvida. Se formos olhar a pirâmide social, que forma o nosso estado e o nosso país, podemos localizar que os principais problemas são majoritariamente enfrentados pelos afrodescendentes. Esse é um debate que nós queremos recolocar, sem tutela. É como se historicamente fôssemos o tempo todo tutelados, como se uma parte da sociedade quisesse fazer política para nós ou tentando construir a ideia que as políticas públicas deveriam melhorar ou minorar a situação enfrentada por esses setores. Nós queremos ser porta-voz das nossas reivindicações, afirmar as bandeiras históricas, levantar os heróis, figuras que foram importantes na história do nosso povo, na tradição de luta do nosso estado para afirmar que nós queremos ter a nossa própria voz.
Muito se fala no desgaste do modelo do PT, nos planos federal e estadual. Existe esse desgaste?
Existe e vem se aprofundando na nossa avaliação. O PT, no que pese ter sido herdeiro e participado do processo de redemocratização do país, cometeu falhas quando abandonou sua trajetória histórica, mudou o curso. Muita gente que viu Lula e o PT chegar ao poder, agora com a presidenta Dilma (Rousseff), tinha 8 ou 10 anos de idade. Agora essas pessoas estão com 20, 22 anos e já atingiram uma certa maturidade, tem uma reflexão mais crítica sobre a realidade. Para o período em que elas viram o PT chegar ao poder para hoje, elas perceberam poucas realizações. Não é a toa que a juventude foi as ruas em junho do ano passado, colocando temas importantes que o meu partido pretende debater na campanha. E como o PT para chegar ao poder acabou se aliando com setores extremamente conservadores do agronegócio, do capital financeiro, das grandes empreiteiras, etc., ele se encontra apeado, amarrado para realizar aqueles projetos históricos que a classe trabalhadora acreditava que ele podia realizar. Nesse sentido, o PSOL surge como alternativa para ocupar esse espaço e tentar estabelecer um contraponto.
É difícil ter um posicionamento mais à esquerda no Brasil?
Muito pelo contrário. Há um espaço de insatisfação. Há uma juventude que vivenciou esse momento político que nós estamos passando agora e que tem um posicionamento muito crítico. Que quer muito mais do que lhes está sendo oferecido. Há um espaço para as ideias de esquerda e esse debate que nós queremos fazer, principalmente com a juventude e todos os setores progressistas que acreditam que é preciso haver mudanças de fato significativa.
Uma questão problemática é o financiamento de campanha. Enquanto os grandes partidos recebem vultuosos valores de diversos setores, os partidos menores, como o PSOL, têm dificuldade. Como fazer campanha com pouco dinheiro?
Nós temos uma definição com relação ao financiamento de campanha, principalmente de não aceitar doações de grandes empreiteiras e de multinacionais ou de empresas vinculadas a esquemas de corrupção. O pequeno proprietário, a pequena empresa, a média empresa, o microempreendedor, a gente não tem problema de dialogar com esses setores e vamos avaliar, principalmente, de empresas nacionais. Mas nós não vamos atrás dessas empresas. Queremos fazer uma aposta numa campanha de doação individual, através de pessoas físicas, pois acreditamos que seja necessário envolver essas pessoas com comprometimento, principalmente na defesa dos nossos programas e na elaboração das políticas públicas. Temos observado que os financiamentos de campanha acabam aprisionando os parlamentares e subordinando as construções das suas propostas legislativas e do planejamento do próprio Executivo aos seus interesses. Nesse sentido, as políticas públicas acabam capturadas pelos interesses privados e atendendo aos interesses desses setores, em detrimento dos problemas da maioria da população.
A militância é uma das apostas nesse processo...
A militância e os eleitores, que acreditam ou que possam vir a contribuir com a nossa proposta de programa político.
No plano nacional, o PSOL tem figuras de destaque, como o senador Randolph Rodrigues (AP), e os deputados Chico Alencar e Jean Willys (RJ). Na Bahia, a posição é mais tímida. Por que o PSOL não aparece tanto no cenário estadual?
Nós estamos enfrentando agora uma contradição de um estado que saiu de um longo período que esteve dirigido por uma oligarquia, comandada pelo finado senador ACM, e que passou por um processo de transição que incorporou elementos, agora dirigido pelo PT, conservadores. Grande parte da classe trabalhadora acabou nutrindo uma esperança que esse projeto que está em curso, coordenado pelo governador Jaques Wagner, pudesse vir a responder as suas demandas. Os movimentos sociais já começam a fazer enfrentamentos, principalmente aqueles que estão nas áreas mais críticas das políticas públicas, e que precisam de respostas e o governo não tem. Porque os seus interesses estão voltados para atender os interesses do grande capital privado, que são as grandes empresas que o financiaram. Precisamos desprivatizar o estado. E para isso nós queremos mais controle sobre o financiamento privado de campanha, para que a gente possa retomar a capacidade de planejamento público do estado e priorizar aquilo que é fundamental para resolver os problemas do nosso estado.
Qual o adversário a ser batido nessa corrida pelo Senado?
Todos eles representam projetos conservadores e que não revelam, em certa medida, as contradições dos seus projetos. E que a gente só vai perceber isso com o desenvolvimento do próprio debate que nós pretendemos fazer. Nesse caso específico, o Geddel representa uma oposição conservadora, não é à toa que ele vai se aliar à chapa do DEM, com o ex-governador Paulo Souto. A Lídice da Mata tenta apresentar a ex-ministra Eliana Calmon como uma terceira via, mas não consegue qualificar o seu debate e deve pautar o seu discurso a partir de uma perspectiva muito formalista, pela influência que ela adquiriu no Judiciário, e nós sabemos que é a política que as decisões tanto influenciam na elaboração das leis, na sua execução, como também na determinação para resolver os principais problemas do nosso estado. Essa é uma diferença que nós queremos apresentar. E o candidato Otto Alencar, pelo mesmo processo, representa o continuísmo do governo Wagner, que nós estamos avaliando que perdeu a oportunidade de construir uma Bahia diferente.