Nardes afirma que país tem problema de governança
O relator das contas de 2014 da presidente Dilma Roussef, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes, salientou que a Presidência da República precisa explicar a destinação de R$ 104 bilhões, montante referente às chamadas pedaladas fiscais, ao contigenciamento de verbas e a novos indícios de irregularidades apontados pelo Ministério Público.
Nardes salientou que a crise internacional não é a principal causa para a situação econômica brasileira. "O problema nosso é interno, não temos governança", apontou, em palestra realizada na tarde desta quinta-feira, 20, durante o II Seminário Internacional de Controle Externo promovido pelo Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE).
O ministro do TCU ainda disse que, dos R$ 104 bilhões que o governo precisa explicar a destinação, R$ 40 bilhões são referentes às pedaladas, R$ 36 bilhões por conta de contingenciamentos e outros R$ 26 bilhões de pedaladas e contingenciamentos.
"O que está constatado em indício inicial é que o governo utilizou esses recursos sem a devida autorização do Congresso Nacional, leia-se da sociedade, sem aprovação da lei orçamentária. A sociedade quer saber onde foram os R$ 104 bilhões", disse Nardes, antes da palestra.
Ele salientou que o julgamento das contas da presidente Dilma Roussef será feito de forma eminentemente técnica e que não se questiona se a aprovação ou reprovação das contas da petista será utilizada para a abertura de um processo de impeachment na Câmara dos Deputados. Na entrevista, salientou que a aplicação da lei deve valer para prefeitos, governadores e para o presidente da República.
"Pensar sobre isso (desdobramento político da apreciação das contas de Dilma) não compete a mim, mas ao Congresso. Coloquei para os técnicos que não se sintam influenciados a não ser pela ilegalidade, e somos guardiões da Lei de Responsabilidade Fiscal, que define que o governo não pode gastar mais do que arrecada, especialmente em período eleitoral", salientou o ministro.
Rei
Embora não tenha ainda concluído o voto sobre as contas da presidente, Nardes disse que o iniciou contando a história do rei da Inglaterra João I que, em 1215, mandou cobrar mais impostos da população após ter gastos os recursos arrecadados além da conta.
"A nossa função é não permitir o desgoverno", comentou o ministro. Ele também observou que não é possível que presidentes ou governadores saibam de tudo o que ocorre na administração pública, por isso recomendou uma alteração de procedimento na apreciação de contas. "Deveria ser um processo trimestral, não anual".
Mas o ministro ainda fez questão de fazer uma diferenciação entre os membros de órgãos de controle e dos que buscam eleição. "Em buca do poder, os governos muitas vezes fazem coisas que não têm limites".
Pressão
Apesar da suposta pressão que o Tribunal de Contas da União vem sofrendo por ter apontado as chamadas "pedaladas fiscais", o presidente do órgão, ministro Aroldo Cedraz disse que "não há nenhum risco de interferência no TCU, venha pressão de onde vier. Não há risco que o TCU possa fugir dos seus trilhos".
A declaração foi feita na manhã desta quinta, pouco antes de o ministro proferir a palestra "Panorama das Entidades de Fiscalização no Mundo Contemporâneo", também durante seminário internacional promovido pelo TCE.
Conforme Cedraz, o TCU "não se abalou em meio a toda essa turbulência que estamos vivendo" e lembrou que a apuração de irregularidades desfechada pela Operação Lava Jato começou com o trabalho das auditorias que o Tribunal de Contas realizou na Refinaria Abreu Lima (Pernambuco).
O ministro Cedraz reiterou o que foi dito mais tarde pelo colega de Tribunal, Augusto Nardes: o julgamento das contas de Dilma será estritamente técnico e não é possível fazer um prognóstico do resultado no TCU.
No momento o TCU aguarda a resposta do Governo Federal sobre as "pedaladas". "Em qualquer colegiado, a perspectiva de placar é pouco provável, porque os votos podem ser mudados na hora. Você tem um entendimento e se alguém levantar um ponto de vista no colegiado pode te convencer", disse.