Acusado de integrar um esquema de venda de sentenças judiciais, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo Medina pediu abertura de sindicância para apurar as denúncias contra ele, e afastamento de suas funções durante o período da investigação. Ele já estava de licença médica até dia 18. Integrantes do tribunal avaliaram a atitude como uma tática para se antecipar à apuração interna, que deveria ser aberta esta semana, e evitar saídas que levassem à perda do foro privilegiado.
Apesar de Medina ter tempo de serviço suficiente para se aposentar recebendo o salário bruto atual de R$ 23,2 mil - é juiz desde 1968 -, um colega de tribunal do ministro avalia que a opção o deixaria sem foro privilegiado, e com risco de ter sua prisão pedida novamente pela Justiça. O procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, chegou a pedir a prisão do ministro, mas ela foi negada pelo relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), César Peluso. Por ser ministro do STJ, Medina é julgado no STF. Caso deixasse permanentemente a função, o caso poderia ser transferido para o próprio STJ, pois também há desembargadores acusados, ou para a primeira instância da Justiça Federal.
O pedido da sindicância e do afastamento foi entregue ao presidente do STJ, Raphael Monteiro de Barros Filho, pelo advogado de Medina, Antônio Carlos de Castro. No documento, o ministro alega que não tem o que temer, e que não pôde entregar o pedido pessoalmente por estar acamado. Castro nega que a ação seja uma tática para manter foro privilegiado. "Foi uma decisão pessoal. Em nenhum momento a aposentadoria foi cogitada, por respeito ao Supremo. Após o oferecimento da denúncia, a aposentadoria não estava na regra do jogo. Pareceria uma tentativa de fuga do julgamento", afirmou. "Mas, como a cada dia surgem fatos novos, que não estão na denúncia e, fora do contexto da investigação, não teriam relevância, o ministro decidiu pelo afastamento, para não constranger o tribunal."
Antes do pedido de Medina, o STJ aguardava o envio das acusações contra ele pelo STF, que analisa denúncia do Ministério Público, para abrir inquérito administrativo, onde as acusações seriam analisadas, com direito a defesa do ministro. Depois, o parecer - pela abertura de processo ou não - seria votado pelos ministros da corte. Caso a investigação fosse adiante, aí sim Medina seria afastado até a conclusão dos trabalhos. No STJ, a punição máxima é a aposentadoria compulsória.
Medina é um dos 28 denunciados pela Operação Furacão da Polícia Federal, que investiga a negociação de decisões judiciais em benefício de donos de máquinas caça-níqueis. O irmão do ministro, o advogado Virgílio Medina, é acusado de pedir R$ 600 mil por uma liminar de Paulo liberando máquinas caça-níqueis. Ele está preso desde o início da operação, no último dia 13.
Além das acusações envolvendo caça-níqueis, as escutas telefônicas em aparelhos do ministro feitas pela PF apontam outros casos sob investigação. Em uma delas, Medina comunica mudança de voto no julgamento de habeas corpus da mulher do contrabandista Law Kim Chong, Miriam. Ele, que havia se posicionado duas vezes contra a concessão do benefício, avisa uma funcionária que votará a favor. A concessão do habeas corpus foi feita pela 6ª Turma do STJ e confirmada depois pelo colegiado de ministros.
Além disso, o ministro também antecipou a um colega o voto que daria em processo do qual era relator. Em dezembro de 2006, o advogado Paulo Eduardo Mello ligou para Medina para saber do processo em que um diretor do Minas Tênis Clube - do qual Mello é presidente do conselho deliberativo - é acusado de usar documento de policial falso. O ministro adianta ao colega seu entendimento, alegando que o diretor estava com o documento, mas não havia se apresentado como policial, e ainda aconselha que o advogado do caso faça sustentação oral. No final, ainda diz a Mello: "Você manda, você manda, viu?" Em outro caso, Medina e o irmão discutem processo contra a filha do ministro, Érika, que corre na Justiça Federal de Minas Gerais. Medina cogita apresentar recurso no próprio STJ. Nos três casos, a defesa do ministro nega irregularidades.