“Tenho uma missão”, diz o rapper Mr. Armeng
Um letreiro de led para anunciar. Uns caixotes achados no lixo para dar um visual, junto com uns vinis que o vizinho não quis mais. Mr. Armeng aposta nisso para seguir na música.
O nome artístico tem tudo a ver: armengue é improviso, o que dá para fazer ali na hora, com o que se tem. Nisso, o mister é mestre. "O negócio é ir armengando, burlar as adversidades sendo criativo. Não ficar preso a nada", diz.
Dois minutos de prosa com ele e já dá para sacar que armengue mesmo é só no nome. O rapper leva o trabalho com seriedade e sem estrelismo, apesar das conquistas: venceu um reality show de música, tem disco gravado pela Sony e canções em parceria com Saulo e Gaby Amarantos.
Tudo muito bom, mas Armeng segue a vida como era antes, morando na casa onde cresceu, no Nordeste de Amaralina, e usando a música para melhorar o bairro onde vive. "Isso é uma das funções do hip hop, ele nasceu pra mudar a realidade do gueto, levar alegria, consciência", considera.
Tanto é que, no Natal, Mr. Armeng quase mudou seu nome artístico para "Moço do Brinquedo", como ficou conhecido pelas crianças do bairro. Armeng distribuiu mais de mil brinquedos.
Melhorar o modo como o Nordeste de Amaralina é visto, aliás, é uma das grandes preocupações de Armeng. "Sempre vi as pessoas de meu bairro aparecendo nas páginas policiais. Quando saímos na cultura, é uma alegria. Tenho a missão de passar pras pessoas que se pode vencer. Tá tudo aí pra você conquistar. Do céu, só cai chuva".
Pensadores
Tanta consciência vem também de berço. Filho do compositor Guiguio do Ilê, Maurício dos Santos Souza (nome que Mr. Armeng quase nem ouve falar mais) cresceu em meio aos quadros de grandes líderes negros. Só na adolescência foi descobrindo aqueles homens: Martin Luther King, Fela Kuti, Zapata, Peter Tosh, Stevie Wonder.
"Esses caras regam nossas lutas, nossa vontade de vencer. Nesse mundo a gente tem que ter alguma coisa na cuca ou vai passar despercebido", conta.
Com tanta inspiração dentro de casa, foi natural começar a compor. O pai, autor de hits como "Adeus Bye Bye", "Por Amor ao Ilê" e "Pérola Negra", comprou um computador para que o filho lhe ajudasse a gravar as composições. Apaixonado por Legião Urbana e Charlie Brown Jr., o menino aprendeu e começou a escrever suas próprias músicas.
A coisa engrenou mesmo quando conheceu o pessoal do Beco da Cultura: Maurício andava de skate e logo se enturmou com gente como DJ Bandido e o grafiteiro Peace.
Pouco tempo depois, já fazia batidas, letras e rimas na banda Cabeça Ativa. Levava o som de seu pai pro bar do João, na Santa Cruz. Nessa época, trabalhava de auxiliar de produção numa fábrica de chocolate.
Armeng Produções
Quando virou frentista de posto de gasolina, Maurício comemorou o aumento de salário comprando instrumentos: teclado, caixa de som, microfone, tudo aos pouquinhos. "No meu quarto, colocava um fio na CPU para dar contato, amarrava o microfone no beliche. Era lá a sede da Armeng Produções".
Foi um passo para deixar o trabalho. Em 2009, lançou o rap "Vem Cá", e foi fazendo outros. Depois, gravou o clipe da música "A Noite É Nossa", com o cineasta Max Gaggino.
Tudo mudou mesmo foi numa noite em que Armeng estava em casa, assistindo televisão. "Passou o comercial do reality show Breakout Brasil e eu inscrevi meus clipes. Recebi um e-mail dizendo que eu tava entre os 40 selecionados".
Surpresa mesmo Armeng teve depois, quando, durante a Lavagem do Bonfim, recebeu a ligação da produção do programa dizendo que era um dos cinco selecionados do reality. "Eu já saí daqui me sentindo vitorioso. Fui para mostrar minha música, rap com berimbau, agogô, percussão. Acabei vencendo. Digo sempre que eu eu era um milho antes de entrar lá. Saí pipoca", ele conta, rindo.
O prêmio foi um contrato assinado e CD pela Sony. O disco saiu com produção de Dudu Marote, que tem no currículo trabalhos com Skank, Jota Quest e Adriana Calcanhotto.
"Armeng é maravilhoso, é um cara que consegue trazer a identidade do Nordeste de Amaralina pra toda a Bahia. Tem uma carga de onde ele vem, das pessoas com as quais ele viveu, do lugar onde ele cresceu, tudo isso tem uma forte cultura da Bahia, do melhor jeito possível. Essa visão precisa ser exportada pro resto do Brasil. Ele merece muito ser ouvido em todo o país", afirma o produtor Dudu Marote.
Para o DJ Mauro Telefunksoul, a palavra que descreve Armeng é guerreiro. "Faz black music de primeira, envolvente, fala do cotidiano dele, de onde veio".
Para o futuro, Armeng quer continuar fazendo seu trabalho. "Com luta, correria e batalha", ele diz, sem medo de errar.