Síria encara Cingapura amanhã por vaga rumo à primeira Copa
O drama de centenas de milhares de refugiados que arriscam a vida tentando escapar da guerra na Síria contrasta com excelentes resultados obtidos por sua seleção. Aliada do governo ditatorial sírio, a Rússia representa não só a ajuda militar, mas o destino sonhado para 2018 com estreia em Copas do Mundo. Uma meta coletiva num país estilhaçado.
Nesta terça-feira, 17, às 9h da Bahia, a Síria enfrenta Cingapura, fora de casa, na quinta de suas oito partidas pela 2ª fase das Eliminatórias Asiáticas. Neste Grupo E, dois dos cinco times avançam para disputar, numa chave de seis equipes, duas vagas para o Mundial. Como o Japão é o maior favorito, os sírios - que já venceram por 1 a 0 e são vice-líderes com dois pontos de vantagem - e os cingapurianos fazem novo duelo crucial.
Parte da diversidade étnica e religiosa da população síria está representada na sua seleção. "Certamente há diferentes pontos de vista dentro da equipe, mas concordamos em não falar sobre política ou religião. Nós nos concentramos somente em fazer tudo o que pudermos para dar esperança ao povo", explicou ao A TARDE o atacante Sanharib Malki, de 31 anos, que construiu carreira em pequenos clubes europeus e atua na Turquia.
Um dos líderes da seleção, o goleiro Mousaab Balhous, 32, chegou a ser preso, acusado de cooperar com uma brigada de insurgentes. Ex-goleiro dos selecionados sub-17 e sub-20, Abdul Baset Al-Sarout, hoje com 23 anos, deixou o futebol para encabeçar a luta armada em 2011. Um tio e quatro irmãos dele teriam sido assassinados pelo exército. Sua guerrilha foi mostrada no filme 'Retorno a Homs'.
O atacante Firas Al-Khatib, 32, que rodou por times asiáticos, rejeitou convocações a partir do início dos conflitos. "Ele tem opiniões políticas contrárias ao presidente e ao exército da Síria. O técnico e a federação também se recusaram a chamar alguns atletas", confirmou o jornalista Ghaith Harfosh, que foi assessor de imprensa da seleção no Mundial Sub-17 deste ano.
Nas redes sociais, há manifestações ideológicas e sobre o drama dos compatriotas. Jogadores usaram como foto principal ou de capa de seus perfis a mundialmente famosa imagem de Aylan Kurdi, de 3 anos, morto numa praia turca após tentativa de sua família de emigrar para a Europa. Mas há espaço também para fotografias em carrões, jet-skis, restaurantes, piscinas, viagens e roupas da moda.
Origem da guerra
Independente da França em 1945 e separada do Egito em 1961 depois de breve união, a Síria sofreu sucessivos golpes de estado. A partir de 2000, o ditador Bashar Al-Assad sucedeu seu pai, que morreu após três décadas no poder. Em março de 2011, começou a guerra civil. Travam batalhas as forças armadas, grupos rebeldes e extremistas do Estado Islâmico, que chegou a dominar mais da metade do território nacional (veja mapa abaixo).

O impasse, que envolve questões políticas, religiosas e econômicas, sofreu intervenções de potências bélicas como EUA, Rússia e França.
Além de mais de 220 mil mortes, a ONU (Organização das Nações Unidas) estima que mais da metade dos 20 milhões de habitantes ficou desabrigada. Nesta conta, estão 4,3 milhões que fugiram em direção a nações vizinhas ou europeias. Sírios compõem um terço dos refugiados que tentaram entrar de maneira irregular na Europa recentemente. A maior crise humanitária hoje, conclui o serviço de inteligência dos EUA, a CIA (Central Intelligence Agency).
Jogos só em duas cidades
Atletas e técnicos morreram no fogo cruzado. Houve êxodo rumo a clubes estrangeiros, o que qualifica a seleção e, por outro lado, reduz o nível das competições domésticas.
Alguns estádios foram destruídos durante a guerra. Por questões de segurança, os jogos do Campeonato Sírio ocorrem apenas em Damasco e Lataquia, apesar da participação de times oriundos de regiões ocupadas por opositores do regime do ditador. A próxima edição está marcada para começar no domingo. Há, sim, atenção ao esporte, apesar de tudo. "A final da Copa da Síria teve 15 mil espectadores", informou o jornalista Harfosh.